Líder: anjo, homem ou super-herói?

A vida organizacional exige que cada um cumpra bem o seu papel. Isso é fundamental para que as atividades, não importa a instancia, fluam de maneira harmônica e o resultado seja a obtenção de resultados que assegurem a existência da corporação. Na teoria isso pode ser comparado a um sistema de programação, onde as coordenadas são dadas e os resultados surgem naturalmente. Contudo, como falar sobre organizações sem considerar fatores como necessidades individuais, sentimentos e posturas diferenciadas dos profissionais? Além disso, ao analisar a essência das empresas é fundamental contar com a presença de alguém capaz de conduzir uma equipe para um mesmo sentido. Ou seja, a existência e a importância do líder nesse contexto nunca deve ser deixada em segundo plano.

A tarefa diária do líder é doce ou árdua? Que papel ele exerce diante das adversidades corporativas: anjo, homem ou super-herói? Isso dependerá do momento que ele vivencia, pois não existe um manual que dê a receita para um líder conduzir uma equipe, afinal cada empresa possui sua realidade e uma cultura que devem ser respeitadas e geridas de forma consciente. “É necessário muito cuidado para não confundirmos a liderança com a arte de agradar e de demonstrar simpatia para as pessoas. Geralmente, em toda liderança sempre existirá coisas desagradáveis a serem feitas”, alerta José Luiz Tejon, professor de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas, consultor estratégico do Grupo Estado e que, entre outras especializações, possui em seu currículo a experiência de ter estudado estratégias de liderança no Insead, na França. Em entrevista, Tejon fala sobre as exigências que as organizações têm feito aos líderes do século 21 e o maior desafio enfrentado por quem tem a responsabilidade de conduzir uma equipe.

José Luiz Tejon é um dos palestrantes mais conceituados de nosso país e também  fora dele.

Confira uma entrevista realizada com ele e aproveite a leitura!

O Sr. costuma afirmar que, geralmente, os termos líder e liderança são confundidos. Na sua visão, o que cada um significa?

José Luiz Tejon - Considero a liderança como sendo o ambiente, os processos, o clima. Já o líder é o condutor, o inspirador, o orquestrador.

A liderança é um dom ou pode ser desenvolvida através de técnicas ou da experiência vivida no campo corporativo?

José Luiz Tejon - A liderança no aspecto da ousadia, da maior pré-disposição ao risco vem em maior ou menor quantidade em alguns seres humanos do que em outros. Porém, a liderança hoje é o resultado do aprimoramento, da experiência de vida processada e contabilizada. Podemos desenvolver aspectos racionais e emocionais, ao longo da vida. A coragem ou a maior capacidade de decidirmos conforme nossos valores, isso exige mais tempo e maturidade de vida. Talvez mais dom, porém o ser humano tem a capacidade de evoluir em todos os aspectos da sua vida.

O Sr. afirma que a liderança é resultado de um aprimoramento. Esse trabalho deve ser uma iniciativa do líder, da empresa que identifica um potencial gestor ou realizado conjuntamente?

José Luiz Tejon - Esse trabalho deve ser conjunto. Quanto mais jovens somos mais dependemos de guias e de estímulos externos saudáveis. Quanto mais maduros ficamos mais precisamos ter autocrítica para o autodesenvolvimento , mas é sempre conjunto, uma interação pessoal, profissional e do meio. A liderança biodinâmica é a síntese da moderna liderança do futuro neste século 21. Isso exige colocar a vida humana e a natureza no centro do empreendimento, da obra, da empresa, da causa.

Quais as principais exigências que o mercado tem feito aos líderes?

José Luiz Tejon - Há uma grande carência de líderes que integrem racionalidade com o coração e com a coragem. Os altos dirigentes estão sendo chamados para responderem a curto espaço de tempo com aumento da lucratividade. E isso, geralmente, é feito com o corte de despesas e pouca criatividade de geração de novos negócios. Os líderes não podem confundir sonho com ilusão. Não podem se deixarem conduzir por projetos ilusionistas. A liderança exige coragem para fazer o que tem que ser feito na hora certa.

Dessas exigências impostas pelo mercado que o Sr. citou, qual o maior desafio para o líder?

José Luiz Tejon - O maior desafio do líder é fazer o que precisa ser feito. Grande parte dos líderes sabe o que precisa ser feito, mas não faz. O ingrediente da coragem é fundamental. Geralmente, isso significa amargos sofrimentos para o líder.

Hoje, ouve-se muito a afirmação de que o líder precisa ser servidor. O Sr. concorda?

José Luiz Tejon - O líder é servidor de uma causa, de uma obra. Sua missão é organizar e entusiasmar um grupo de pessoas para juntos servirem a uma causa maior. Se isso é ser servidor, então é. Muito cuidado é necessário para não confundirmos a liderança com a arte de agradar e de ser simpática para as pessoas. Geralmente, em toda liderança sempre existirá coisas desagradáveis a serem feitas.

O que é necessário para ser um bom líder?

José Luiz Tejon - Um bom líder precisa atuar a serviço de uma causa maior e, pelo seu exemplo, conduzir as pessoas ao seu lado. Um líder precisa atuar com a diversidade humana e respeitá-la. Um líder precisa saber quando é a hora de sair e criar sucessores.

Para ser um líder completo é preciso ter anos de experiência ou um jovem profissional também pode executar o papel da liderança com o mesmo êxito?

José Luiz Tejon - A liderança total... A liderança biodinâmica exige vivência. Como jovens podemos ser ótimos líderes pontuais. Líderes parciais. Contudo, a liderança biodinâmica exige vivência, tempo, aprendizado de observação e muito auto-conhecimento. Isso precisa de tempo e de vontade, ou seja, quanto mais consciência e maior a vontade, mais conseguiremos encurtar esse tempo.

Qual a sua opinião em relação à liderança espiritualizada?

José Luiz Tejon - A espiritualizaçã o é essencial, pois é o que cria a liderança invisível, ou seja, aquela onde o ambiente, o clima e o estado de espírito regem a liderança, mesmo quando as pessoas não estão mais sendo observadas.

O líder é um ser humano como outro qualquer e passível de cometer erros. As empresas estão cientes desse fato e têm tratado os líderes de forma correta?

José Luiz Tejon - Os líderes falham sim, erram sim. Porém, precisam aprender desde cedo com os próprios erros. O líder precisa evoluir exponencialmente a partir do custo de seus erros. Cabe ao líder antever erros. Antever os icebergs do oceano. Cabe ao líder ter a antevisão, pois é isso que o diferencia de todos os demais.

Quem o Sr. destacaria como um líder exemplar?

José Luiz Tejon - Ozires Silva é um belíssimo líder por ter realizado a indústria aeronáutica brasileira e enfrentado todas as descrenças a respeito disso. E hoje, com certeza, deveria ser muito mais valorizado, ouvido e ter um posto de alta honra na Embraer, na educação e formação de novos líderes brasileiros.

Que postura a área de RH deve ter diante do desenvolvimento dos líderes?

José Luiz Tejon - A área de RH precisa, acima de tudo, agir como uma área de liderança biodinâmica. Deve realizar esse trabalho sendo quase que invisível. O ego dos dirigentes de RH, com exceções, é determinante para os fracassos do setor e para que o RH entre em competição desnecessária e improdutiva com outros departamentos organizacionais. Muitas vezes, inclusive, extrapolando claramente a sua área de eficácia. Mais lamentável ainda é quando as pessoas dirigentes de RH não conseguem exercer com muita sobriedade a "equação humana", deixando-se envolver em avaliações, julgamentos e precipitações pré-conceituais, sem contar, muitas vezes, o desconhecimento de como se ganha e como se perde dinheiro naquela determinada organização. Mas, tirando esses aspectos, a área de RH moderna é vital para o estabelecimento da liderança biodinâmica, pois pode interferir e agir na busca do equilíbrio e da harmonia das virtudes e das fraquezas humanas desde os acionistas até o chão de fábrica.

Que conselho o Sr. para os profissionais de RH que pretendem realizar alguma ação pontual para os gestores?

José Luiz Tejon - Os profissionais de RH devem ter consciência muito clara sobre os desafios de cada negócio, da competição de cada negócio, dos fatores críticos de sucesso de cada negócio. Precisam saber quais características do líder são essenciais para o êxito naquele particular negócio e empresa. Precisam “desenhar” o modelo ideal de liderança e de relacionamento entre a "trama" de líderes da empresa. Devem avaliar pessoas e profissionais que possam expandir os seus limites para a ampliação dos seus universos como líderes biodinâmicos e avaliar quais são líderes pontuais, parciais, porém fundamentais nas suas áreas de expertise. Jamais confundi-los. Apoiar o CEO nas tomadas de decisão sobre contratações, demissões, promoções. Precisam apoiar as pessoas no auto-conhecimento, no design de si mesmas. Há um trabalho terapêutico e sociológico fundamental, vital para o sucesso das organizações de maneira extraordinária. E isso é resultado do time. E o time é resultado da qualidade da sua liderança. Da liderança situacional para a liderança biodinâmica o salto é ambicioso, mas necessário.

Fonte: RH.com.br